segunda-feira, 30 de agosto de 2010

"Grandes são os desertos e as almas desertas e grandes..."

"Time After Time", Chet Baker, 1964 
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No cenário musical, mais especialmente o do jazz, acumulam-se os nomes de músicos que em algum momento de suas vidas, sucumbiram à dependência química.
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Charlie Parker, Billie Holiday, Miles Davis, John Coltrane, Thelonious Monk, Stan Getz, Paul Desmond, Bill Evans... Entretanto, nenhum teve a realidade da dependência tão tragicamente acompanhada quanto Chet Baker.
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Chet era um James Dean do jazz, com o sex appeal de um Elvis Presley, cuja voz aveludada apenas sussurrava as notas como um anjo de asas caídas. Longe de ser um trompetista de recursos virtuosos, como Dizzy Gillespie ou Miles Davis, compensava a falta de paciência para o estudo da teoria musical, bem como a ausência de muitos dentes (cogita-se que os tenha perdido num ajuste de contas com traficantes) com bons ouvidos e boa memória. Seu talento inato retratava o sentimento em meio a compassos lentos e melodias melancólicas. Um estilo do qual seria o próprio sinônimo, o "cool jazz".
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Em seu universo conturbado e contraditório, Chet Baker cantava com suavidade a antítese de sua vida. Se tudo era efêmero e destrutivo, a música abreviava vazios. Motivo pelo qual continuou a gravar discos e a fazer shows, mesmo sendo um arremedo do músico que foi. Talvez sentisse, mesmo por breves lampejos, que ao compartilhar qualquer coisa entre sentimento e dor, tivesse finalmente o espírito apaziguado.
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"Um homem é sempre presa das suas verdades.
Uma vez reconhecidas, não pode libertar-se delas..."

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Albert Camus,
in: O Mito de Sísifo.
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sábado, 21 de agosto de 2010

Imagem em preto e branco.

TV Lovers, © Foto de Jan Saudek, 1991
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Precursor dos estudos midiológicos, o filósofo Marshall McLuhan tinha um discurso provocativo sobre os efeitos dos meios de comunicação sobre os seres humanos.

Para ele, todas as mídias são extensões do homem e essa estreiteza anestesiou a percepção do consciente, fazendo com que nosso comportamento e ações sejam manipulados, influenciados. À revelia desses efeitos sociais e psíquicos, estaríamos viciados em atividades extra-corpóreas, automatizados, lobotomizados.

A realidade como a conhecemos deixou de ser REAL. As tarefas cotidianas mais prosaicas, as instituições, os empregos, as relações... são como uma espécie de holograma repetitivo.

Os aforismos impactantes e as expressões semióticas cunhadas pelo filósofo, tinham um único foco, o de alertar para a revolução que seria a convergência entre a realidade do homem recém-civilizado e do novo homem tribal.

O fato é que estamos testemunhando a precisão de muitos de seus pensamentos
a implosão de toda a economia em sua substância: sistemas monetários, mercados, regimes políticos; bem como, nossa passiva transformação em seres indiferentes, mecanizados. DESCIVILIZADOS.

Se alguns, com sua visão preconizadora e humanista de futuro não conseguem sublimar ideologias vazias, resta-nos ainda o alento de pensar que situações limite e cataclismas culminam em profundas transformações.
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"Enquanto não se olhava para as pessoas, elas não existiam. Começavam a existir, como na TV, quando alguém lhes dirigia o olhar. Só então permaneciam na mente desse alguém, antes de serem apagadas por novas imagens. O mesmo era verdade em relação a ele. Olhando-o, os outros poderiam iluminá-lo, expô-lo e revelá-lo; não ser visto equivalia a tornar-se indistinto e desaparecer."


Jerzy Kosinski, in: O Vidiota. .
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terça-feira, 17 de agosto de 2010

Eleições 2010...


Mafalda, Liberdade e a incredulidade.
Clique na tirinha para ampliar.
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Espaços vãos.

Rest, Vilhelm Hammershoi, 1905
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"Existem pessoas tão habituadas a estar só consigo mesmas, que não se comparam absolutamente com outras, mas, com disposição alegre e serena, em boas conversas consigo e até mesmo sorrisos, continuam tecendo sua vida-monólogo. Se as levamos a se comparar com outras, tendem a uma cismadora subestimação de si mesmas: de modo que devem ser obrigadas a reaprender com os outros uma opinião boa e justa sobre si: e também dessa opinião aprendida quererão deduzir e rebaixar alguma coisa. Portanto, devemos conceder a certos indivíduos a sua solidão e não ser tolos a ponto de lastimá-los, como freqüentemente sucede."

Nietzsche, in: Humano, Demasiado Humano.
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quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Agenda: clássicos do jazz ao vivo

Thelonious Monk, © foto de W. Eugene Smith, 1959
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A Casa do Saber em parceria com a Sala Baden Powell, inicia amanhã um curso livre sobre alguns dos maiores gênios do cenário jazzístico. Intitulada "Clássicos do jazz ao vivo", a série faz um retrospecto da obra e vida de Duke Ellington, Cole Porter, Herbie Hancock e Thelonious Monk.

Os maiores clássicos de cada compositor serão apresentados por músicos ao vivo em quatro encontros mensais, sempre às quintas-feiras. O evento começa com Cole Porter no dia 12 de agosto, e segue com Duke Ellington no dia 09 de setembro, Thelonious Monk no dia 07 de outubro e Herbie Hancock no dia 11 de novembro. As inscrições para cada encontro custam R$ 30,00.
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.Maiores informações:
Casa do Saber

Av. Epitácio Pessoa, 1164, Lagoa
Tel: (21) 2227-2237
De seg à sex, das 11h às 20h
http://www.casadosaber.com.br/
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Jam Session...
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Duke Ellington, Take The A Train



Thelonious Monk, Blue Monk



Herbie Hancock, Watermelon Man


Cole Porter, Night and Day, na interpretação de Ella Fitzgerald
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domingo, 8 de agosto de 2010

"Eu queria até mesmo saber ver..."

The Balcony Room, Adolph Menzel, 1848
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Abri curiosa
o céu.
Assim, afastando de leve as cortinas.

Eu queria entrar,
coração ante coração,
inteiriça
ou pelo menos mover-me um pouco,
com aquela parcimônia que caracterizava
as agitações me chamando

Eu queria até mesmo
saber ver,
e num movimento redondo
como as ondas
que me circundavam, invisíveis,
abraçar com as retinas
cada pedacinho de matéria viva.

Eu queria
(só)
perceber o invislumbrável
no levíssimo que sobrevoava.

Eu queria
apanhar uma braçada
do infinito em luz que a mim se misturava.

Eu queria
captar o impercebido
nos momentos mínimos do espaço
nu e cheio

Eu queria
ao menos manter descerradas as cortinas
na impossibilidade de tangê-las

Eu não sabia
que virar pelo avesso
era uma experiência mortal.

Ana Cristina Cesar.

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domingo, 1 de agosto de 2010

Agenda: Exposição Anita Malfatti

A Festa da Cor, Anita Malfatti, 1889-1964
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Dividida em sete módulos dispostos em ordem cronológica, a exposição "Anita Malfatti - 120 anos de nascimento", ocupa todo o primeiro andar do Centro Cultural Banco do Brasil até o final de setembro.
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Gosto muitíssimo de alguns de seus quadros, mas não consigo abandonar a sensação de que me soam muito referenciais. A artista flertou com o expressionismo (fase que mais me agrada), o cubismo, o impressionismo naturalista, a arte naïf e o academicismo. Diversidade de estilos à parte, Anita Malfatti é sem dúvida uma pintora de excepcionais recursos, que parecia interrogar-se permanentemente. Assistir a exposição é uma grande pedida.
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Exposição "Anita Malfatti - 120 anos de nascimento"
Centro Cultural Banco do Brasil
Rua Primeiro de Março, 66, Centro (Salas A à F, primeiro andar)
Ter à Dom, das 10h às 21h
De 01 de agosto à 26 de setembro de 2010
Entrada Franca

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O Farol, 1915
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Quintal com Casario, s.d.
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A Japonesa, 1924
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Meu irmão Alexandre, 1914
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Tropical, 1917
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O Homem Amarelo, 1915-1916
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Paisagem de Ouro Preto, 1948
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O Camponês, s.d.
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As Margaridas de Mário, 1922
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La Rentrée, 1927
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Mário de Andrade I, 1921-1922
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A Estudante Russa, 1915
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Eu tenho a alma errante
e vago na terra a sonhar maravilhas...

Não para um momento!
Eu busco irriquieto o meu sonho inconstante
e sou como as asas, as velas, as quilhas,
as nuvens, o vento...

Eu sou como as coisas inquietas: o veio
que canta na leira; a fumaça que voa
na espira que sobe das achas; o anseio
dos longos coqueiros esguios;
a esteira de prata que deixa uma proa
no espelho dos rios.

Eu tenho a alma errante...

Boêmio, o meu sonho procura a carícia
fugace, procura
a glória mendaz e preclara.
Sou como a veia fenícia
ao largo, uma vela distante...

Eu tenho a alma errante...

E sinto uma estranha delícia
em tudo que passa e não dura,
em tudo que foge e não pára...
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Menotti Del Picchia.
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