Dark Ballet, faixa do álbum "Madame X", Live Nation, Interscope Records e Maverick, a ser lançado em 14 de junho de 2019.
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Madonna, mais uma vez, expandindo o conceito de cultura pop para algo muito maior. Ao evocar uma Joana D'arc personificada no corpo de um homem negro, gay, transgênero não-binário e soropositivo (o rapper, poeta e ativista americano Mykki Blanco), ela toca em questões contemporâneas e absolutamente pertinentes. Julgar e sumariamente condenar continua sendo uma prática, sobretudo se você pertence a uma minoria. Nenhum outro artista pop soa tão competente ao criar pequenas narrativas audiovisuais que se sobrepõem ao mero intuito de entreter. Música, cinema, fotografia, teatro, artes plásticas, moda, religião e comportamento — temas recorrentes no universo da artista — estão presentes em "Dark Ballet" e habilmente condensados em camadas e mais camadas de simbolismo e poesia.
Beth Gibbons, Sinfonia No.3, Mov. III: Lento - Cantabile-Semplice, Henryk Górecki
Orquestra Sinfônica da Rádio Nacional Polonesa, regência: Krzysztof Penderecki, 2019
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Homens atiram 80 vezes em um carro de família assumindo o risco de matar porque o extermínio de símbolos de insignificância social, racial, sexual, econômica e ideológica tornou-se coisa banal. E você se incomoda ou mesmo chora se ainda lhe resta algum resquício de consciência. E desacredita e pragueja e se enfraquece. Tudo é muito vil e feio, vil e feio. Então, esses mesmos homens — os que ainda resistem a brutalidade, a arbitrariedade e ao adoecimento psíquico — enxergam a beleza contida no mundo, se inspiram e se apiedam dele, de sua condição ainda primeva e celestial, 'sempre' a resistir à nossa virulência opressiva e devastadora; e criam poesia. Compõem músicas, tocam instrumentos, esculpem, pintam, cultivam flores e frutos, a manutenção dos afetos... e cantam. Cantam ainda que seja um lamento.
A simpática lojinha de cd's, na Rua do Rosário, se equilibrava graças a resiliência do proprietário, um entusiasta que resistia ao esvaziamento do segmento.
Cláudio faleceu há pouco mais de um mês e a loja vai fechar as portas essa semana.
Enquanto o Noturno No.9 avança, só consigo pensar nas horas de boa música e que a vida sem paixões não faz o menor sentido. .
Ella Fitzgerald Sings The Cole Porter Songbook, 1956, Verve Records (Pt.1)
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Ella Fitzgerald Sings The Cole Porter Songbook, 1956, Verve Records (Pt.2)
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Nina Simone era uma força da natureza; Billie Holiday cantava como se estivesse em carne viva; Sarah Vaughan, com a melhor de todas as técnicas; mas Ella Fitzgerald era a própria música; e sua voz o mais harmonioso e afinado dos instrumentos.
Partita No.1 in Si Bemol Maior, BWV 825, Johann Sebastian Bach
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A chave da música de Bach: o desejo de evadir-se do tempo. A humanidade não conheceu outro gênio que tenha apresentado com maior pathos o drama da queda do tempo e a nostalgia do paraíso perdido. As evoluções de sua música dão uma grandiosa sensação de ascensão em espiral até os céus. Com Bach nos sentimos nas portas do paraíso; nunca nele. A pressão do tempo e o sofrimento do homem caído no tempo amplificam a saudade de mundos puros, mas não nos transportam para eles. O pesar pelo paraíso é tão essencial nesta música que nos perguntamos se Bach teve alguma vez lembranças que não fossem as do paraíso. Um imenso e irresistível apelo ressoa profeticamente nela e qual é o sentido desse apelo senão tirar-nos deste mundo? [...] Quem, no êxtase desta música, não tenha sentido o transitório de sua condição natural e não tenha vivido a série de mundos possíveis que se interpõem entre o paraíso e nós não entenderá por que suas tonalidades estão constituídas por beijos de anjos.
"Copo Vazio",faixa do álbum "Gil Luminoso", de 2006
gravada originalmente por Chico Buarque, em 1974, para o álbum "Sinal Fechado, a composição é do próprio Gil
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Ontem assisti "O Homem das Multidões", de Cao Guimarães e Marcelo Gomes. Se é sempre constrangedor observar pessoas levantando e abandonando um filme no meio da projeção, é absolutamente lindo que ao final dela alguns tipos de alma permaneçam com seus olhos marejados e seus silêncios.