sábado, 27 de outubro de 2012

"Ninguém perde (repetes em vão) senão quem não tem e que não teve nunca..."

 Acrobat with bouquet, Marc Chagall, 1963

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Já não é mágico o mundo. Te deixaram.    
Já não partilharás a clara lua                      
nem os lentos jardins. Já não há uma        
lua que não seja espelho do passado,       
cristal de solidão, sol de agonias.              
Adeus às mútuas mãos e as têmporas       
que aproximavam no amor. Hoje só tens    
a fiel memória e os desertos dias.             
Ninguém perde (repetes em vão)              
senão quem não tem e que não teve        
nunca, mas não basta ser valente              
para aprender a arte do esquecimento.
Um símbolo, uma rosa, te desgarra           
e te pode matar uma guitarra.                    
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II
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Já não serei feliz. Talvez não importe.       
Há tantas outras coisas no mundo;            
Um instante qualquer é mais profundo       
e diverso que o mar. A vida é curta              
e ainda que as horas sejam tão longas, uma
escura maravilha nos ronda,                        
a morte, esse outro mar, essa outra flecha  
que nos livra do sol e da lua                          
e do amor. A sorte que me deste                  
e me tiras-te deve ser apagada;                   
o que era tudo tem que ser nada                  
Só me resta o gozo de estar triste               
esse inútil costume que me inclina              
ao sul, a certa porta, a certa esquina.
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Jorge Luis Borges.
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quarta-feira, 17 de outubro de 2012

"Pensem nas feridas como rosas cálidas..."

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algumas flores
teimam em viver
apesar do tempo
apesar do peso
apesar da morte
apesar de algumas
que teimam em morrer
apesar de tudo

Alice Ruiz.
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domingo, 14 de outubro de 2012

Esse est percipere...

Nostalgia, direção de Andrei Tarkovsky, 1983
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"...Nem tudo se pode saber ou dizer, como nos querem fazer acreditar. Quase tudo o que sucede é inexprimível e decorre num espaço que a palavra jamais alcançou..."
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Rainer Maria Rilke, in: Cartas  a um Jovem Poeta.
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quarta-feira, 10 de outubro de 2012

(( Incomunicabilidade ))

  The Mute, Louise Bourgeois, 2002
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Querer que qualquer um seja sensível ao nosso mundo íntimo é o mesmo que estar sentindo um zumbido no ouvido e pensar que o nosso vizinho de ônibus o possa escutar.
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Mário Quintana, in: A Vaca e o Hipocrifo.
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quarta-feira, 3 de outubro de 2012

"O que é o não sentido? Doença que mais se propaga."

 The Sense of Sight, Annie Louisa Swynnerton, 1895
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O que é o caminho?
anúncio de partida
escrito em folhas que o pó desenhou.



O que é a árvore?
lagoa verde cujas ondas são o vento.

 

O que é o vento?
alma que não quer
habitar o corpo.

 

O que é a morte?
Carro que leva
Do útero da mãe
Ao útero da terra.

 

O que é o arco-íris?
Corpo de nuvem e
Corpo de sol
Abraçados arqueados
Sobre o corpo da terra.

 

O que é a onda
Imagens em movimento
Na tela do mar.

 

O que é o sonho?
Elevar o real
Ao nível da fantasia.

 

O que é o pó?
Futuro do corpo.

 

O que é o anoitecer?
Discurso de despedida.

 

O que é a lágrima?
Guerra perdida pelo corpo.

 

O que é o desespero?
Descrição da vida na língua da morte.

 

O que é o horizonte?
espaço que se move sem parar.
    
 

O que é a coincidência?
fruto na árvore do vento
caindo entre as mãos
sem se saber.

 

O que é o não sentido?
Doença
Que mais se propaga.

 

O que é a existência?
O que requer sempre
Revisão.

 

O que é a pobreza?
Tumba ambulante sobre a terra.
 


O que é a memória?
casa habitada só
por coisas ausentes.

 

O que é a poesia?
navios que navegam, sem portos.   

 

O que é a memória?
Casa habitada só
Por coisas ausentes.

 

O que é viver?
Caminhar sem pausa
Rumo ao anoitecer.

 

O que é a história?
Cego a tocar tambor.

 

O que é a chuva?
Último viajante
A descer
Do trem das nuvens.

 

O que é o rosto?
Porto mais próximo para a migração da lágrima.

 

O que é a melancolia?
Anoitecer
No espaço do corpo.


O que é o tempo?
Veste que usamos
Sem poder tirar.

 

O que é a linha reta?
Soma de linhas tortas
Invisíveis.

 

O que á a metáfora?
Asas aliviando
No peito das palavras.

 

O que é o sentido?
Início do não sentido
E seu fim.
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Adonis, 

Trechos do poema "Guia para Viajar pelas Florestas do Sentido".
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segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Alienismos...

 The Extraction of the Stone of Madness or The Cure of Folly (detail), Hieronymus Bosch, 1475-1480
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"Sanidade é uma mentira aconchegante."
Susan Sontag.




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Importante: Estou ajustando as imagens dos posts à nova interface do blogspot. Infelizmente excluíram a opção de dimensioná-las manualmente. Queiram desculpar-me também por ocasionais links corrompidos. Toda e qualquer modificação nos gadgets não está sendo salva... Até que tudo se normalize, obrigada pela compreensão.

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