segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Invisibilidades...

 Las Duas Fridas, Frida Kahlo, 1939


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"No vácuo de mim eu me despenco. Porque seria preciso também abdicar de mim mesmo para novamente reconstruir-me. Tornar a escolher os gestos, as palavras, em cada momento decidir qual dos meus eus assumir. Já esfacelei meu ser, já escolhi as porções que me são conveninentes esquecendo deliberado as outras. E são elas - serão elas? - que agora se movimentam revoltadas, pedindo passagem em gritos mudos, na ânsia de transcender limites, violentar fronteiras, arrebentando para a manhã de sol. O tremular da chama é um aceno convite para chegar à verdade última e íntima de cada coisa.

Não quero. Não posso restar nu, despojado de mim mesmo. Não posso recomeçar porque tudo soaria falso e inútil. As minhas verdades me bastam, mesmo sendo mentiras. Não é mais tempo de reconstruir. Em luta, meu ser se parte em dois. Um que foge, outro que aceita...

Sôfrego, torno a anexar a mim esse monólogo rebelde, essa aceitação ingênua de quem não sabe que viver é, constantemente, construir, não derrubar. De quem não sabe que esse prolongado construir implica em erros, e saber viver implica em não valorizar esses erros, ou suavizá-los, distorcê-los ou mesmo eliminá-los para que o restante da construção não seja abalado. Basta uma pausa, um pensamento mais prolongado para que tudo caia por terra. Recomeçar é doloroso. Faz-se necessário investigar novas verdades, adequar novos valores e conceitos. Não cabe reconstruir duas vezes a mesma vida numa única existência..."


Caio Fernando Abreu, in: O Inventário do Ir-remediável.

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quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

"Ou toca, ou não toca..."

 Sea Viewed from the Heights of Dieppe, Eugene Delacroix, 1852
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"… não é enquanto está ‘no meio’ de meu mundo que o outro me olha, mas é enquanto ele vem em direção ao mundo e a mim com toda sua transcendência, é enquanto ele não está separado de mim por distância alguma, por objeto algum do mundo, nem real, nem ideal, por nenhum corpo do mundo, mas pela sua única natureza de outrem."
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Jean Paul Sartre, in: O Ser e o Nada.

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